segunda-feira, 11 de março de 2013

CAMINHO PARA O NADA


O ciclo da imagem e o ressurgimento do cinema

alimenta este fogo com fogo, até que se extinga e obterás a coisa mais estável que penetras todas as coisas, e um verme devorou o outro, e emerge esta imagem” (Abraham Eleazar) 


Muito já se disse sobre o fim do cinema, sobre a desmistificação da experiência cinematográfica e da sua desintegração a partir da multiplicação da imagem. A limitação imposta ao longo desses anos pelo cinema dominante - de que a imagem deve ser cada vez mais revestida de um manto de realismo - impõe à imagem uma falsa noção de verdade, reduzindo o cinema a uma espécie de simulacro. A imagem fílmica perde sua aura, sua fascinação diante do mundo, para dar lugar a uma conceituação mimética da realidade, provocando uma desorientação diante das novas perspectivas e possibilidades de se vivenciar o mundo através das imagens atualmente. A experiência do cinema, sufocada ainda pela pulverização massificada da imagem, provoca uma série de sintomas que dizem respeito diretamente ao ver. Há que se assumir, então, uma postura crítica diante da imagem nos dias de hoje. Ciente disso, Monte Hellman busca redefinir, em Caminho para o Nada, as nuances que remodelam uma nova ordem da imagem nos tempos atuais, mas que em momento algum decretaram o fim do cinema enquanto ritual sagrado de apreensão de experiências fílmicas. Por isso, o filme é, acima de tudo, sobre os valores adquiridos pelas imagens hoje e sobre como elas se constroem até chegarem refletidas para o público. É, portanto, um jogo de espelhos onde não sabemos mais o que é reflexo de quê. O que é ilusão e o que é verdade.
Por isso, Caminho para o Nada é essencialmente um filme sobre ver; sobre como e para onde direcionar o olhar diante dessas imagens. Funciona da mesma maneira que boa parte dos filmes de Abbas Kiarostami (Five, Ten, Shirin, ABC Africa), onde a pedagogia do olhar convida o espectador a sair de sua posição de passividade, desafiando-o, expurgando dele a sua posição de vouyer, e convidando-o a “ler” imagens, e não apenas apreciá-las. Afinal, é preciso estar muito atento ao jogo proposto por Monte Hellman - que é, no final das contas, o próprio jogo das imagens - para que não se caia na armadilha de definir o filme apenas como metalinguagem. Se há um jogo metalinguístico operado por Monte Hellman, antes de uma referência ou uma homenagem ululante sobre o "fazer cinema", é o de transportar  o espectador para dentro do filme, tirando-o de sua passividade através da ilusão da participação estabelecida. O espectador toma para si o papel de hermeneuta que precisa interrogar minunciosamente as entrelinhas da imagem para, quem sabe então, decifrá-la.
Por isso, existem várias versões de uma mesma história em jogo: 1) a estória de Velma Duran (Shanyn Sossamon) e Rafe Taschen, escrita por uma blogueira; 2) o filme dentro do filme, dirigido por Mitchel Haven (as mesmas iniciais de Monte Hellman); 3) o documentário produzido mais tarde pela blogueira e 4) a reunião disso tudo que é o filme de Monte Hellman. Esse jogo de espelhos põe em crise todas as camadas do processo fílmico, captados por uma hibridez de formatos, gêneros e suportes, promovendo uma espécie de desorientação da realidade fílmica, embaralhando nossas percepções diante do mundo - e do cinema - e nos colocando em alerta diante da construção dos discursos políticos e culturais através do uso da imagem.
Monte Hellman leva a discussão da margem, da fronteira, a um outro nível de pensamento e reflexão. Não se trata de discutir o que é ficção e o que é documentário, nem do ponto de convergência entre eles - como muito se tem feito no cinema contemporâneo - mas de uma rarefação da imagem a partir dos signos que ela propõe. A verdade da arte e não a verdade do mundo, do outro. Afinal, mesmo a ficção dirigida por Mitchel Haven sendo delineada a partir de uma série de conjecturas, de hipóteses enevoadas acerca da morte de Velma e Rafe, existe antes uma verdade que parece indissociável do filme, que é a de que Velma Duran e Laurel Graham são a mesma pessoa. É Duran/Graham/Sossamon a grande força motriz do filme de Haven/Hellman, e é por ela que a câmera irá se “apaixonar”.

A verdade está no corpo e nunca nos fatos. A primeira sequência do filme de Haven se constrói exatamente a partir desta idéia: plano longo de Duran/Graham/Sossamon pintando as unhas de vermelho sentada à beira da cama. Se esse parece ser um plano que pouco ou nada diz sobre a história, ou sobre os fatos, ele é, sobretudo, a imagem síntese desse embate entre fato e ficção, verdade e mentira: quem está pintando as unhas? Quem é aquela mulher? Qual das personagens ela está personificando ali? O que é ela se não a própria materialização dessa fantasmagoria engendrada pelo cinema? Hellman não nos dá respostas, ele apenas nos propõe dúvidas, perguntas.
Mas Caminho para o Nada é sobretudo um filme político. Não porque sua história seja sobre uma ativista política que lutou contra o regime cubano, mas porque Haven/Hellman conduz seu filme para um outro escopo, que é o da câmera como artefato político, como arma que atira verdades para o mundo. Imagens/projéteis disseminados, que nos revelam várias facetas de um mundo completamente fragmentado e distorcido. Não é à toa que Hellman povoa seu filme com câmeras, tvs de LED, lap-tops, celulares; são eles o ponto de intersecção das elipses do filme, o ponto de encontro entre passado, presente e futuro, embaralhando as noções de tempo e espaço.
Essa relação estreita com a tecnologia, e com a maneira com que as imagens são apreendidas e disseminadas, aproxima o filme a, por exemplo, Redacted, de Brian de Palma. Em Caminho para o Nada, uma garota interiorana do sul dos Estados Unidos posta uma série de fatos e estórias sobre a morte conturbada e obscura do casal Velma e Rafe num blog na internet. É esse o ponto de partida para a realização de um filme que começa como um documentário para, aos poucos, tornar-se uma ficção. Em Redacted, De Palma parte de um vídeo postado em um blog para ficcionalizar uma verdade, criando uma ficção que é ela mesma a reconstrução de um fato, de uma verdade até então escondida e negligenciada. Ao percorrerem caminhos semelhantes em busca de suas respectivas verdades fílmicas, De Palma e Hellman parecem nos dizer que o cinema pode ser, sim, um espelho do mundo e da vida. Ainda que os fatos sejam secundários, é a forma quem nos conduz para uma verdade insondável, para uma verdade que está além da superfície.
Caminho para o Nada é, portanto, um filme autofágico, que reprocessa todos os procedimentos, formas e técnicas para criar um corpo de cinema. Um corpo vivo de cinema, que respira, que abre suas entranhas para revelar-nos suas vísceras, suas articulações, órgãos, seu espírito, enfim. Tal qual Two-Lane Blacktop, onde o cinema engole a dramaturgia através da combustão do filme para nos dizer que o filme acaba, mas o cinema e a vida continuam. Personificação das ouroboros - serpentes que devoram sua própria cauda - Caminho para o Nada reflete um estágio fecundo do cinema, uma evolução, experiência alquímica de renovação, de transcedentalização. É a resposta de Hellman para aqueles que dizem que o cinema está para morrer. Quando, o que ele quer mesmo, é viver.

segunda-feira, 4 de março de 2013

O Som ao Redor

Sobre cinema, em primeiro lugar


Sobre cinema, em primeiro lugar

Saber olhar à sua volta com os olhos de cinema e tentar aprisionar na câmera apenas o que pode ser filme é algo que Kleber parece saber fazer muito bem. Por que O Som ao Redor é um filme que propõe um movimento de experiência estética que desloca o espectador de certo distanciamento e passividade, colocando-o num terreno ao mesmo tempo familiar e incômodo, exatamente porque dilui a crítica e a afetividade num mesmo recipiente, não nos confrontando moralmente com qualquer daqueles personagens, mas nos colocando em pé de igualdade com eles. Afinal, o que são aqueles personagens se não caricaturas de uma sociedade marcada por movimentos históricos tão caros ao Brasil? A caricatura, é claro, não assume tons de cinismo ou de desdenho: os personagens são o que são, pois vivem naquele determinado lugar, envoltos em uma névoa historicista que molda as ações de cada um. O ridículo que impõe o caricatural está menos na representação do que na constatação de um estado de coisas, que revela um país caricato por si só, que se desenvolve valendo-se de certos modelos de representação que realçam o tom burlesco, farsesco do comportamento da sociedade brasileira como um todo. Em O Som ao Redor, a sociedade brasileira é uma paródia de si mesma.

Por isso, é interessante que a discussão em torno do filme tenha se reduzido a questões de conteúdo pragmático, quando o seu grande mérito está mesmo é na forma. É essa maneira de Kleber se relacionar com o cinema para coletar as suas impressões sobre o mundo que faz o filme ser tão festejado internacionalmente. Arrisco a dizer que o sucesso internacional do filme pouco tem a ver com sua contundência social. O que impressiona mesmo é como Kleber consegue criar um microcosmo de cinema que consegue dizer tantas coisas, de maneira tão inventiva e apaixonada, com um misto de simplicidade e sofisticação que poucas vezes encontramos no cinema brasileiro. Pois O Som ao Redor é, acima de tudo, um filme que se comunica muito bem com seu interlocutor, que tem clareza no que quer mostrar, promovendo um diálogo mais forte e menos pedante com seu público. Se há mesmo um trunfo, é o de encontrar nos meandros do cotidiano algo que se pode chamar de potência fílmica. E são poucos os cineastas que têm faro para isso.

Essa consciência da experiência do cinema faz com que o diretor não crie apenas um filme que é uma radiografia sobre uma classe média, sobre um Recife, ou sobre um Brasil. Kleber constrói um filme que é um feito exatamente por traduzir todo um contexto sócio-político através de uma dramaturgia do cotidiano transmutada para ser cinema, para provocar não só as discussões pelas quais a crítica brasileira de modo geral tem se debruçado (o coronelismo, a luta de classes, a violência e a transformação das cidades), mas para nos colocar diante disso que se chama de experiência do cinema. De uma relação que se dá com as imagens, e não somente com os temas.

Porque existem muitas influências em jogo, em O Som ao Redor. Nos zooms que lembram Tarantino, mas são devotos mesmo é de Hong Sang-Soo. Na maneira como a violência penetra silenciosa e invisível na vida dos personagens, tal qual nos filmes de um Michael Haneke. Na relação vital que se tem com os espaços e na câmera que acompanha menos os personagens e mais os próprios ambientes, algo aprendido com o cinema de John Carpenter (o tal João Carpinterio que dá nome à escola rural situada no engenho do personagem de W.J. Solha) – que, aliás, é influência constante no filme, principalmente quando a câmera se movimenta lentamente na iminência do horror, do suspense. Na montagem e no som, que são Chris Marker, mas também são outros. Nas várias histórias e personagens que se cruzam, ou não, numa espécie de multiplot à la Robert Altman. E há também Eduardo Coutinho, nas fotos que abrem o filme, que são de Cabra Marcado pra Morrer, e funcionam como espécie de prólogo do filme de Kleber. O Som ao Redor está todo embebido do cinema consumido por Kleber ao longo de todos esses anos. Entretanto, em momento algum Kleber usa essas referências todas como muleta, ou de maneira enciclopédica. As citações e influências aparecem de forma bastante orgânica, como um reprocessamento natural dos elementos que o moldaram enquanto cineasta. É a experiência dele com o mundo que delimita a experiência dele com o cinema.
  
Pouco se tem dito sobre O Som ao Redor ser, antes de qualquer coisa, um filme de alguém absolutamente apaixonado pelo cinema, pela experiência do cinema. É fácil constatar: basta voltar aos textos críticos de Kleber Mendonça Filho e à sua maneira, enquanto espectador, de apreender e experimentar os filmes. Kleber sempre se declarou, acima de tudo, um cinéfilo, daqueles que sentem literalmente tesão pelo que é cinema, pela maneira como o cinema e todas as suas ferramentas podem traduzir um certo "estado de espírito" diante do mundo. Esse tesão pelos filmes o coloca, tal qual um Tarantino, acima de tudo, como um cineasta/cinéfilo que reprocessa suas referências para criar algo que é inteiramente seu. Afinal, O Som ao Redor é talvez o grande tributo de Kleber a esse cinema que o excita, aos filmes e cineastas que, ao longo de todos esses anos, acompanhou de perto, e lhe deram uma noção concreta do que vem a ser esse tal de cinema contemporâneo.

quarta-feira, 16 de janeiro de 2013

Melhores de 2012


Eu sempre faço textinho de cada filme justificando minhas escolhas, coisa e tal. Os filmes são selecionados com base no calendário de estréias nacionais da FilmeB. Boa parte deles continua inédito em Goiânia (por pouco tempo), outros passaram apenas pela Mostra “O Amor, a Morte e as Paixões”. E eu ainda fiquei sem ver o novo do Abbas Kiarostami que provavelmente estaria nas cabeças dessa lista de vinte filmes - por que 10 foi pouco pra um ano tão cheio de coisa boas!



1 - Caminho para o Nada, Monte Hellman
2 - Mistérios de Lisboa, Raoul Ruiz
3 - O Homem que Não Dormia, Edgard Navarro
4 - Isto Não é Um Filme, Jafar Panahi
5 - Cosmópolis, David Cronenberg
6 - As Quatro Voltas, Michelangelo Frammartino
7 - L’Apollonide, Bertrand Bonello
8 - Memórias que Só Existem Quando Lembradas, Júlia Murat
9 - Ha Ha Ha, Hong Sang-soo
10 - Holy Motors, Leos Carax
11 - O Pai das Minhas Filhas, Mia Hansen Love
12 - Um Verão Escaldante, Phillipe Garrel
13 - Memórias de Xangai, Jia Zhang Ke
14 - Kaboom, Gregg Araki
15 - 13 Assassinos, Takashi Miike
16 - Girimunho, Clarissa Campolina e Helvécio Marins
17 - O Porto, Aki Kaurismaki
18 - Adeus, Primeiro Amor, Mia Hansen Love
19 - Um Método Perigoso, David Cronenberg
20 - Habemus Papam, Nanni Moretti

quarta-feira, 9 de janeiro de 2013

O cinema é Carax, ou Carax é o cinema?

O ano de 2012 não foi um ano bom para esse blog. Na verdade foi um ano intenso para este que vos fala, ano em que vários desafios foram encarados de uma só vez, o que desviou de certa forma meu foco e meus interesses em relação ao cinema. Foi um ano surpreendentemente intenso, cheio de trabalho, de projetos que ainda virão, mas que ganharam forma em 2012. Mas – e digo isso por mim nesse primeiro momento – o ano de 2012 foi o ano do Cine Cultura. Ano em que todas as energias foram direcionadas pra esse pequeno santuário do cinema em Goiás. Para que ele pudesse retomar o seu lugar de sempre, e ir ainda mais além. Ano em que o Cine Cultura começou a alçar novos vôos, começou a ganhar mais corpo, mais sangue, mais carne. Tornou-se vivo novamente.

Digo isso tudo, que nem tem a ver com o meu post pra dizer algumas coisas sobre a Mostra Leos Carax; alías, sobre o cinema do Leos Carax. O meu orgulho na verdade vem de – como programador do cinema, mas, sobretudo como cinéfilo – Goiânia estar recebendo uma retrospectiva que tem rodado algumas poucas cidades mundo afora. São apenas três filmes, mas são cópias em 35mm originais, vindas diretamente da cinemateca francesa, o que não é pouco. É oportunidade pra se absorver esse cinema em sua totalidade. Afinal Carax – principalmente nesses 3 primeiros filmes – sempre se mostrou um enorme defensor da película, da imerssão do espectador dentro de uma sala de cinema. Seu filmes são sobre isso também. Sobre ver cinema!

A mostra é claro pega o embalo do oba-oba criado em cima de Holy Motors, filme recém lançado de Carax e que tem causado enorme frisson na crítica (e nos cinéfilos, claro) mundo afora. Entretanto a mostra ignora esse seu último filme, para dar destaque aos seus 3 primeiros longas, todos eles decisivos para a história do cinema francês do final dos anos 80 e início dos 90. Era o momento em que a geração MTV começava a se formar, quando o videoclipe – e a publicidade - passou a ser a grande influencia de um sem número de cineastas. Na França esse momento foi representado por gente como Luc Besson e Jean Pierre Jeunet basicamente. Nesse período, Carax foi duramente taxado como um desses representantes que emulavam a linguagem do videoclipe dando uma verve pop a seus filmes, mas sem ter muito a dizer. Uma balela! Por que Carax e seu maneirismo, seu barroquismo, apesar de sustentar certa referência ao videoclipe, ao rock e à música pop, constrói um cinema muita mais consciente e incrivelmente rico e interessante, se valendo é claro de suas influências que perpassam toda a história do cinema francês. Corrijo. Não só do cinema francês, mas do cinema mundial. Referências que vão desde o cinema mudo, de Chaplin, Keaton, Vigo, do cinema de gênero, do melodrama, mas principalmente de Godard, Tati, Melville, cineastas caros à obra Carax.

Percebe-se então que Carax quer pensar o cinema e a arte como processo de fruição de idéias, de experiência estética. É um cinema do corpo, do ator, da montagem, do quadro (e do fora-de-quadro). Um cinema da potência fílmica, onde tudo parece estar em um processo de intensa combustão. Um cinema do som, da música, das cores. Se a genialidade de Carax se sustenta – e é tão celebrada – é exatamente por que poucos diretores conseguiram impregnar o cinema de tantas coisas, colocando-o em perspectiva com outras artes. Com a pintura, com a música, com o teatro e claro com o próprio cinema de uma maneira tão viva, tão cheia de surpresas.

O que não faz do cinema de Carax um caldo de referências histórico-anarquistas como é o cinema de um Tarantino por exemplo. É claro, existe no cinema de Carax um anarquismo estético que está muito mais ligado à forma com que Carax absorve, questiona e reprocessa suas experiências e referências para criar uma coisa que é sua. As referências não gritam para o público dizendo “olha ali o Godard”, ou “isso aí é uma homenagem ao Tati ou Vigo”. Não! Carax não precisa desse tipo de citação para reverenciar o cinema – até por que seu cinema não é só reverência, é também indagação. Tudo parece surgir de maneira bastante orgânica, arejada, nova, como se essas referências estivessem invisíveis, mas ainda assim, presentes em cada fotograma de seus filmes. É um cinema que pensa o cinema, e não um cinema de referências reeditadas, atualizadas banalizadamente (não que o cinema de Tarantino seja, mas há outros!).

Enfim, falar do cinema do Carax é algo que no final das contas acaba ficando meio vago, por que é cinema que demanda como poucos, a experiência genuína do “ver”, do “olhar”, do “sentir”. E poder experimentar isso em sua plenitude, dentro de uma sala de cinema, com cópias lindas em película, só faz a viagem ser mais e mais intensa e prazerosa.

segunda-feira, 23 de janeiro de 2012

Um adendo...


Revisando a programação da 5ª mostra "O Amor, a Morte e as Paixões" vejo que deixei passar alguns filmes que merecem destaque. Primeiro, "A Música Segundo Tom Jobim", novo filme do genial Nelson Pereira dos Santos, sobre um dos mais geniais artistas brasileiros. Não precisa muito mais que isso pra dizer que é obrigatório!

Outro grande destaque é a exibição da obra-prima do nosso Lourival Belém Jr. "Recordações de Um Presídio de Meninos". Em conversa de buteco com alguns amigos há um tempinho atrás ele foi eleito como o melhor filme goiano de todos os tempos. Eu concordei.

Pra quem ainda não viu, imperdível também a sequência de "O Bandido da Luz Vermelha", agora dirigido pela musa Helena Ignez, além do segundo longa do lendário cineasta brasileiro Edgard Navarro, o filme de horror, "O Homem que Não Dormia".

Pra finalizar o adendo, vale muito ver "Saturno em Oposição" do turco/italiano Ferzan Ozpetek, outra interessante revelação do cinema turco ao lado de Nuri Bilge Ceylan e Fatih Akin.

Mostra começa nesta quinta-feira com a exibição do novo longa de Beto Brant "Eu Receberia as Piores Notícias de seus Lábios", adaptação da obra de Marçal Aquino. A entrada é franca, portanto cheguem cedo.

Abaixo a programação completa da Mostra:
http://lisandronogueira.files.wordpress.com/2012/01/programacao_oamoramorteeaspaixoes_jan-fev-2012.pdf

quinta-feira, 19 de janeiro de 2012

5ª Mostra “O Amor, a Morte e as Paixões”.


Depois de um hiato de 7 anos, uma das Mostras mais importantes de Goiânia volta dessa vez com número recorde de 60 filmes, em sua maioria ainda inéditos na cidade. Têm-se aqui oportunidade rara de ver filmes que mesmo distribuídos comercialmente no Brasil, não chegariam às salas caretas do circuito goiano. Organizada pelo professor Lisandro Nogueira, essa edição traz filmes essenciais no panorama cinematográfico internacional contemporâneo. Os destaques ficam por conta do essencial filme de Jafar Panahi “Isto Não é um Filme”, dos novos dos lendários Monte Hellman, Aki Kaurismaki, Eduardo Coutinho, Moretti, Van Sant, Eastwood, Coppolla e Sokurov, bem como novos talentos como Mia Hansen-Love, Bonello, Apichatpong, Beto Brant, entre outros.

Já tendo visto boa parte deles na Mostra SP do ano passado, indico aqui os filmes que não se pode perder nessas quase três semanas em que Goiânia irá viver e respirar o cinema em seu melhor. A partir do dia 26 estarei aqui postando textos, dicas e comentários sobre os filmes que vi, pra quem não quiser dar tiro no escuro. Seguem aqui minhas indicações dos filmes já vistos com suas cotações, bem como de destaques que ainda não vi, mas merecem atenção.


Vistos:
- Isto Não é Um Filme, de Jafar Panahi *****
- Luzes na Escuridão, de Aki Kaurismaki ****
- Tio Boonmee, de Apichatpong Weerasethakul ****
- Inquietos, de Gus Van Sant ****
- As Canções, de Eduardo Coutinho ****
- Cartas do Kuluene, de Pedro Novaes ***
- Deixa Ela Entrar, de Tomas Alfredson ***
- O Espião que Sabia Demais, de Tomas Alfredson ***
- Tetro, de Francis Ford Coppola ***
- Poesia, de Lee Chang Dong ***
- A Alegria, de Felipe Bragança e Marina Meliande **
- Turnê, de Mathieu Almaric **
- Lola, de Brillante Mendoza **
- Submarino, de Thomas Vinterberg *
- O Conto Chinês, de Sebastián Borensztein º

Destaques:
- Riscado, de Joel Pizzini
- L’Apollonide – Os Amores da Casa de Tolerância, de Bertrand Bonello
- O Homem que Não Dormia, de Edgard Navarro
- Caminho para o Nada, de Monte Hellman
- A Separação, de Ashgar Farhadi
- As Neves de Kilimanjaro, de Robert Guédiguian
- O Porto, de Aki Kaurismaki
- A Guerra está Declarada, de Valérie Donzelli
- Adeus Primeiro Amor, de Mia Hansen-Love
- J. Edgar, de Clint Eastwood
- Eu Receberia as Piores Notícias dos Seus Lindos Lábios, de Beto Brant
- Reis e Ratos, de Mauro Lima
- Mãe e Filha, de Petrus Cariry 
- Habemus Papam, de Nani Moretti
- Transeunte, de Eryk Rocha
- Fausto, de Alexander Sokurov

quinta-feira, 12 de janeiro de 2012

Melhores de 2011

2011 pode ser encarado como o ano do cinema brasileiro. Poucas vezes tanta variedade de gêneros e títulos se fez disponível para o grande público no que me parece um princípio da democratização da distribuição cinematográfica no país. Culpa da Vitrine Filmes, com um dos projetos mais ousados e corajosos que o cinema brasileiro viu em muito tempo. Culpa também dessa geração de novos cineastas, que a despeito da irregularidade de muitos filmes, têm buscado sempre uma nova identidade, um novo olhar para o Brasil, nosso povo, nossa cultura, nosso cinema. Foi ano também de mestres já consagrados, nos maravilhando, com boa parte da lista ocupada por nomes de peso, ainda que tenham ficado de fora  figurinhas carimbadas da cinefilia e que, ou desapontaram muito (Mallick), ou  continuaram num mesmo patamar de desinteresse e mediocridade de seus últimos filmes (Lars Von Trier). Seleção, como sempre, tem por base o calendário nacional de estréias (Filme B) e portanto ainda continuam inéditos em Goiânia boa parte dos selecionados (alguns deles serão exibidos na Mostra "O Amor, a Morte e as Paixões" que começa dia 26 de janeiro). Nenhum problema em tempos de compartilhamento de arquivos, em que boa parte deles já estão sendo semeados mundo afora. Por fim, não poderia deixar de escolher os melhores filmes goianos de 2011, uma vez que a grande quantidade de filmes exibidos ao longo do ano permitiu a descoberta de algumas belas obras, de cineastas que merecem ser acompanhados de perto. E vamos por que 2012 já começa com tudo.

1) Pacific

Marcelo Pedroso faz um dos mais importantes e fortes registros da classe média brasileira que eu vejo em muito tempo. E é o registro produzido por essa própria classe-média que irá nos conduzir a um mergulho quase que godardiano ao universo de faz-de-conta que toma conta dessa fatia da sociedade brasileira, captado pelas imagens das mais variadas mídias que vão se fundindo pra se construir um filme épico, uma espécie de Titanic moderno, onde a tragédia não está no choque com um iceberg, mas no choque entre ilusão e realidade. Um confronto que revela uma consciência naufragada de uma sociedade que se vê deslumbrada pela possibilidade crescente de um consumismo desenfreado, fechando os olhos para os problemas que empurram a sociedade para um abismo sem fim.

2) Isto Não é um Filme

Existem tantas coisas em jogo nesse filme de cativeiro de Jafar Panahi. Poderia ser apenas um filme político, mas não é. Poderia ser uma experiência de linguagem onde o processo de criação de Panahi, acaba se diluindo no próprio processo fílmico que é “Isto Não é Um Filme”, confrontando o brainstorm da criação artística sendo rabiscado na tela com a impossibilidade de Panahi de conceber livremente a sua arte. Se existe a censura, existe antes a capacidade do artista em driblá-la. Desde já um dos filmes mais importantes dessa década.

3) Cópia Fiel


Kiarostami, agora longe da realidade conturbada de sua terra natal, filma duplos, triplos, quádruplos. Filma uma versão de todos os romances do mundo, uma cópia incopiável, mas que é ela mesma, um reflexo, uma imitação da própria vida. Juliette Binoche impecável, em mais uma experiência fascinante do grande Abbas Kiarostami.

4) As Praias de Agnes

Agnes Varda volta ao seu universo pessoal, algum tempo depois de Os Catadores e Eu. Nesse sentido As Praias de Agnes é um filme de intimidade, onde a vida, os pensamentos, as memórias, a alma da diretora são construídas através das impressões que a própria diretora tem daquelas paisagens, e dos objetos e pessoas que compõem aquele espaço. Nessa ânsia de coletar impressões e sentimentos sobre sua própria vida, Varda faz um de seus filmes mais fortes e emocionantes.

5) Singularidades de Uma Rapariga Loura

Manoel de Oliveira no auge de sua forma aos 104 anos continua nos deixando perplexos com mais essa pequeníssima, mas grandiosa obra-prima toda orquestrada por olhares furtivos, janelas que se abrem para o mundo e para o amor, nessa adaptação sensacional do conto de Eça de Queiroz.


6) Tio Boonmee, Que Pode Lembrar de Suas Vidas Passadas

Ainda que em revisões Tio Boonmee não consiga se firmar como o melhor filme do cineasta tailandês Apichatpong Weerasethakul, o simples fato de ser o primeiro filme do diretor distribuído no Brasil já é motivo mais que suficiente para celebração. Afinal, Apichatpong é um dos grandes do cinema atual, e mesmo um filme seu não-tão-bom-quanto-os-outros, já é bem melhor que a grande maioria do que se vê em cinema em qualquer ano.

7) Além da Vida/Inquietos


Eastwood e Van Sant resolvem falar de morte para filmar as pequenas belezas da vida. Se em Eastwood o além da vida é a própria sobrevivência, é a chance de se recomeçar, de se reencontrar, para Van Sant, a morte é a eternização da vida, da memória. Belíssimos filmes de 2 dos maiores cineastas americanos em atividade.

8) Pânico 4

Wes Craven já havia nos brindado com um delicioso conto de horror sobre múltiplas personalidades e representações com o ótimo “A Sétima Alma”. Mas é com a retomada da série Pânico, que traz à tona toda a carga política e alegórica que Craven sempre imprimiu em sua filmografia. Dessa vez numa radiografia absolutamente mordaz sobre a sociedade contemporânea, das celebridades instantâneas, do sensacionalismo, do sucesso a qualquer preço.

9) A Pele que Habito

O mais almodovariano dos filmes de Almodóvar não poderia ficar de fora de uma lista de melhores. É quase como rever toda a sua filmografia em um filme só. E mais desvairado e deliciosamente nonsense do que nunca.

10) A Caverna dos Sonhos Esquecidos

Em nenhum outro filme a experiência do 3D se faz tão orgânica e visceral como nesse novo documentário de Herzog. É o embrião do cinema em gestação, filmado dentro do ventre da terra.

Menções honrosas:
As Canções, de Eduardo Coutinho
Margin Call, de J.C. Chandor
Os Residentes, de Thiago Mata Machado
Super 8, de J. J. Abrams
Meia Noite em Paris, de Woody Allen
Homens e Deuses, de Xavier Beauvois
Um Lugar Qualquer, de Sofia Coppolla
Desassossego, filme coletivo
Vênus Negra, de Abdellatif Kechiche
Ricky, de François Ozon
Aterrorizada, de John Carpenter
A Sétima Alma, de Wes Craven


Melhores filmes goianos: 
- Mañana Cest Carnaval, de Alyne Fratari



- O Desespero Fotográfico de Meu Pai, de Carlos Cipriano



- Eu Não Caibo Mais Aqui, de Banedito Ferreira

- Julie, Agosto e Setembro, de Jarleo Brabosa



- Mero, de Camila Leite


Menção honrosa pro longa Cartas do Kuluene, de Pedro Novaes.

sábado, 24 de setembro de 2011

Impressões em 1ª Pessoa sobre PACIFIC.



Devo dizer que saí completamente consternado do filme de Marcelo Pedroso ontem na reabertura do Cine Cultura. Até então, eu nunca tinha visto um filme que refletisse e representasse a classe-média brasileira (da qual eu faço parte) de uma forma tão frontal e íntima, tão visceral e empática. O filme passava e a cada sequência, eu me lembrava da minha família, meus amigos, de momentos semelhantes que passamos juntos...

Marcelo Pedroso, perturbado por essa dificuldade de representação que o cinema brasileiro tem de representar sua classe-média, lança-se num terreno um tanto movediço para nos dar um retrato de uma fatia da sociedade que sempre se esquivou do reflexo de sua imagem, como representação cultural e social. Depois de ontem, percebo que ainda é difícil que essa classe-média se reconheça de fato, vendo Pacific, pois antes de tudo existe o julgamento. Entretanto, julgar os outros, significa julgar a si próprio. 

Marcelo Pedroso ciente de todas essas implicações, reunindo imagens dos próprios passageiros do cruzeiro “Pacific”, constrói um filme que se esquiva o tempo todo de uma certa crítica banal sobre a sociedade brasileira, sem nunca apontar o dedo para o atual estado dessa classe-média nesse Brasil que injeta a idéia do crescimento econômico na vida e nos sonhos das pessoas. Marcelo, consciente do impacto das imagens dos passageiros, e do poder de sugestão e reflexão dessas imagens, deixa para o espectador o trabalho de pensar acerca de como essa classe-média brasileira vive esse momento tão alardeado de boom econômico. Momento em que, com a linha de crédito largamente ampliada, é facilmente possível viajar num transatlântico – o que antigamente era ostentação de ricaços que se esbaldavam em luxuosos navios – parcelando a viagem em 12 vezes facilmente encaixáveis dentro de seu orçamento. Se existe em Pacific, uma crítica ao consumismo desenfreado, dessa classe média que ostenta e esbanja sem se posicionar diante de uma realidade brasileira um tanto distorcida, ela surge naturalmente dessas imagens que pululam na tela, hora nos emocionando, hora nos instigando, nos confrontando com as suas ilusões.

Pacific é um filme que suscita uma série de questões éticas, sociais e morais. É um filme que coloca em cheque essa representação social, retirando máscaras, sem nunca deixar de reconhecer ali que somos todos produtos de um mundo pré-programado, de um mundo que nos dita a maneira como devemos nos vestir, nos portar, enfim, de um mundo que nos dita como ser feliz, mas que ainda não descobriu que a felicidade está mesmo é dentro de cada um de nós, é piegas, mas é isso mesmo.

quinta-feira, 11 de agosto de 2011

Depressão pós filme, ou como o cinema também pode se deprimir.

O cinema Lumiére, de maneira quase que vanguardista aqui em Goiânia, começou desde a semana passada a promover cabines para a imprensa local, coisa que nenhuma sala se interessou em fazer, tendo em vista a fragilidade da crítica e imprensa local ao longo de todos esses anos, coisa que aos poucos vai sendo redesenhada através de um movimento que tem fortalecido bastante o papel da crítica para o cinema local. Cabe aqui um alerta aos demais cinemas da cidade, que deveriam seguir a mesma linha de pensamento. A longo prazo, essa iniciativa fará bem para todos: exibidores, espectadores e crítica.

Dito isto, fomos submetidos hoje, à cabine de "The Beaver" ("O Castor" aqui muito bem traduzido para "Um Novo Despertar" - o filme faz jus à tradução tosca), filme dirigido por Jodie Foster, que ainda atua ao lado de Mel Gibson, o protagonista da trama. Tudo em "The Beaver" me parece um tremendo equívoco, desde a escolha do elenco, com um Mel Gibson se esforçando para fazer caretas pra nos mostrar que está em depressão profunda. Ou de uma Jodie Foster completamente fora do eixo, com uma personagem completamente rasa, que bota o marido pra fora como se ele estivesse tendo ataques histéricos, ao invés de ser tratado como doente que é. As relações familiares são tratadas aqui com a profundidade de um pires e Jodie Foster, sem traquejo algum pra desenvolver imageticamente aqueles personagens em ruínas, acaba se rendendo aos mais banais clichês, esfregando um monte de coisas na cara do espectador pra ver se ele saca as sutilezas que o filme propõe. Sutilezas do peso de uma jubarte diga-se de passagem.

Engraçado também como o filme se trai o tempo todo, hora criticando o mercado de auto-ajuda, hora ele próprio sendo um genuíno produto de auto-ajuda. Jodie Foster me parece dona de uma preguiça mental impressionante. Alguns dizem que o problema seria o roteiro, mas francamente, grandes diretores fizeram obras-primas a partir de roteiros medíocres. Claro, o roteiro me pareceu risível do começo ao fim, mas o fracasso maior do filme está na direção canhestra e boçal de uma Jodie Foster completamente limitada e presa às mais fáceis e óbvias fórmulas do cinema norte-americano.

Resta ao final um moralismo dos mais baratos. Depois da perda de um membro, o fim da depressão e a reconciliação familiar, todos vivem felizes para sempre, fazendo loopings na montanha russa que a matriarca da casa projetou. Montanha russa sem loopings, sem adrenalina, sem emoção.

Filme visto no Lumiére Bouganville.


quinta-feira, 28 de julho de 2011

FACETAS DO CINEMA ORIENTAL - PROGRAMAÇÃO COMPLETA

Sessões às 12:30, 15 e 20h 

01/08: Abertura - Gozu (Dir. Takashi Miike)
02/08: Eternamente Sua (Dir. Apichatpong Weerasethakul)
03/08: Adeus ao Sul (Dir. Hou Hsiao Hsien)
04/08: Minha Mágica (Dir. Eric Khoo)
05/08: 13 Assassinos (Dir. Takashi Miike)
06/08: Sonata de Tóquio (Dir. Kiyoshi Kurosawa)
07/08: Vingança (Dir. Johnnie To)
08/08: A Floresta dos Lamentos (Dir. Naomi Kawase)
09/08: O Mundo (Dir. Jia Zhang ke) - DEBATE APÓS A SESSÃO
10/08: Eu Não Quero Dormir Sozinho (Dir. Tsai Ming Liang)
11/08: Mad Detective (Dir. Johnnie To e Wai Ka-Fai)
12/08: Mal dos Trópicos (Dir. Apichatpong Weerasethakul)
13/08: Pulse (Dir. Kiyoshi Kurosawa)
14/08: Kinatay (Dir. Brillante Mendoza)
15/08: Cidade do Desencanto (Dir. Hou Hsiao Hsien)
16/08: O Ultrage (Dir. Takeshi Kitano)
17/08: Sonata de Tóquio (Dir. Kiyoshi Kurosawa)
18/08: Adeus ao Sul (Dir. Hou Hsiao Hsien) -
DEBATE APÓS A SESSÃO
19/08: Minha Mágica (Dir. Eric Khoo)
20/08: O Mundo (Dir. Jia Zhang ke)
21/08: Pulse (Dir. Kiyoshi Kurosawa)
22/08: Vingança (Dir. Johnnie To)
23/08: 13 Assassinos (Dir. Takashi Miike)
24/08: Mal dos Trópicos (Dir. Apichatpong Weerasethakul) -
DEBATE APÓS A SESSÃO
25/08: Kinatay (Dir. Brillante Mendoza)
26/08: Mad Detective (Dir. Johnnie To e Wai Ka-Fai)
27/08: O Ultrage (Dir. Takeshi Kitano)
28/08: Cidade do Desencanto (Dir. Hou Hsiao Hsien)
29/08: Eu Não Quero Dormir Sozinho (Dir. Tsai Ming Liang)
30/08: Eternamente Sua (Dir. Apichatpong Weerasethakul)
31/08: Encerramento - Filme surpresa

quinta-feira, 14 de julho de 2011

FACETAS DO CINEMA ORIENTAL

Pela primeira vez o público goianiense vai poder ter acesso a uma série de grandes filmes orientais ainda inéditos nos cinemas da cidade a partir de 1º de agosto. Serão 17 filmes e 3 debates que buscarão traçar o panorâma do que melhor se produz hoje no Oriente. Breve posto aqui programação completa. Mas já da pra imaginar que a obra-prima fundamental "Adeus ao Sul" do mestre Hou Hsiao Hsien (imagem da vez aqui do blog) estará na programação seguido de debate. Aliás, os debates ficarão por conta dos amigos e parceiros Rodrigo Cássio, Marcelo Rodrigues, Fabrício Cordeiro e Luiz Felipe Mundim, além de mim. Aguardem.

sexta-feira, 24 de junho de 2011

As Margens de Tonacci - Serras de Desordem

Andrea Tonacci esteve no FICA ministrando o curso "A Margem do Cinema" e a exibição de sua obra-prima, Serras da Desordem, me fez desenterrar esse texto de 2006, quando vi o filme pela primeira vez na cobertura da Mostra SP que fiz pro extinto blog Arca Mundo. O mais importante, é que o impacto do filme continua o mesmo, e eu ainda mais fã desse gênio chamado Andrea Tonacci.

Serras da Desordem

Como um filme pode mudar nossas vidas, nossa visão de mundo, invadir nossos pensamentos, nossas almas? Essas respostas foram-me todas respondidas após o fim da sessão do brasileiro Serras da Desordem, de Andréa Tonacci.

Tonacci era pra mim, um diretor desconhecido. Mesmo apesar de saber de sua importância para o cinema nacional, quando na década de 70, ele fazia um cinema bastante underground e por isso mesmo, nunca teve o hype de diretores da época que ganharam notoriedade como Glauber Rocha, Joaquim Pedro de Andrade, Arnaldo Jabor.

Fato é que ele chega depois de um hiato de quase 30 anos - tempo em que se dedicou a este projeto - com uma das mais bonitas e essenciais obras-primas dessa Mostra e talvez de toda a história do cinema brasileiro.

Serras da Desordem é, antes de qualquer coisa, um lamento a essa civilização decadente, de valores completamente deturpados e invertidos, de um mundo que, em nome do progresso, deixou de olhar a vida e tudo o que dela vem.

Não bastasse ser o filme-vida que é, Tonacci, como cineasta e estudioso da linguagem cinematográfica, vai ainda muito além do que havia feito, por exemplo, Eric Khoo em seu Fica Comigo, ao misturar ficção e realidade. Isso porque, ao recontar a saga do índio Carapiru, Tonacci vai reencenar certos trechos de sua vida (com o próprio Carapiru, aliás). Utilizando-se de imagens documentais - que vão de filmes da época como o seminal Iracema: Uma Transa Amazônica de Jorge Bodanski, até imagens de Telejornais, também da época - busca refazer os passos daquele homem que, separado de sua tribo após um ataque de grileiros, vagou durante meses pela selva e, encontrado por camponeses, com eles viveu por um bom tempo. Mesmo sem entender uma só palavra do que diziam, fez grandes amigos, pessoas que lhe amaram, lhe deram carinho e cuidado. Após uma denúncia, é trazido pela FUNAI para Brasília, e lá, frente ao choque com a civilização, Carapiru aos poucos irá perder a fé na vida, no seu Deus maior. Por ironia do acaso, quando chamado um tradutor para conversar com o velho índio, este que vem é ninguém menos que seu filho, separado dele há 16 anos por criminosos invasores que expulsaram e assassinaram centenas de índios nas florestas desse Brasil. Carapiru será levado de volta a sua tribo, e lá vai perceber que o veneno da civilização e do progresso terá atingido seu povo. Tudo o que ele vivera ou sonhara não passa agora de uma utopia. Carapiru então desiludido e triste se embrenhará no meio da floresta, e lá, travará seu primeiro contato com Andréa Tonacci, num final de uma beleza que faz jus a esse impressionante filme que é Serras da Desordem.

Assim, o filme irá nos confrontar com essa realidade torpe de uma sociedade que, na busca pelo ócio através do progresso tecnológico, criou um imenso vazio espiritual, um distanciamento abissal do homem com a natureza, uma quebra de valores tão caros a esse planeta doente e carente de lamentos, que gritem por socorro, por um chamado divino, para que um dia nos possa vir a salvação. Talvez, vendo obras como essa, possamos despertar em nós, o desejo da mudança, da reavaliação de nossas vidas, nossas prioridades, nossos anseios, nossa verdade, nossos valores, nossa condição humana.

Tudo o que eu disser sobre esse impressionante filme nacional - mas que carrega consigo um teor imensamente global, pois no registro do microcosmos, abrem-se as portas para o macro – pode soar pequeno, bobo. Mas é sem dúvida o filme brasileiro a ser descoberto. Um filme que o mundo todo deveria ver. Me lembrou de certa forma O Novo Mundo de Terrence Malick, por ser um lamento semelhante. Com a diferença que aqui, a ficção e a realidade são uma coisa só! E o impacto disso em nós é infinitamente maior!

segunda-feira, 13 de junho de 2011

XIII FICA

 
Apartir de amanhã estarei na Cidade de Goiás cobrindo pela primeira vez para a "Revista Cinética", o XIII FICA. Aqui pro blog devo soltar alguns posts diários sobre o Festival, mas a cobertura completa pra revista vem só depois de domingo, dia da premiação dos vencedores. Pra quem tiver interesse, e quiser acompnhar, fica aí a dica!

sexta-feira, 3 de junho de 2011

Romero, um gênio!

O ótimo blog "Film Studies for Free" traz esse mês uma série de estudos sobre o cinema essencial do mestre do horror George A. Romero. Há textos bastante interessantes como o de Michael Bloom  'Reanimating the Living Dead: Uncovering the Zombie Archetype in the Works of George A. Romero' e o de Lars Bang Larsen 'Zombies of Immaterial Labors: the Modern Monster and the Death of Death', além de vários artigos sobre política e sociedade sob a ótica de seus filmes. Valo a pena uma conferida!

sexta-feira, 8 de abril de 2011

Elefante Brasileiro

O massacre de Realengo, tal qual o de Columbine, é um Elefante! Grande, misterioso, complexo. Gus Van Sant fez com Elefante talvez o seu filme mais importante, principalmente por que registra, fugindo de contornos psicológicos, o caos da sociedade contemporânea, do isolamento do indvíduo, da incomunicabilidade, do terror e da violência como válvulas de escape num mundo completamente tragado pelo ego e pelo fanatismo.


No Brasil a questão me parece ainda mais complexa, por quê envolve no cerne, a questão social, educacional ética e de saúde pública do Brasil.

Na verdade é interessante acompanhar um dia depois, o reflexo desse massacre na mídia brasileira - que sempre adorou explorar os dramas humanos, mas nunca assumiu um ponto de vista para defender a sociedade que ela tanto explora. A mídia imediatista e irresponsável não se preocupa com os meandros que provocam tragédias como essa, ela quer sangue e lágrimas. Nada mais.

Fica a manchete estampada num dos jornais de grande circulação aqui de Goiânia: "Nossas crianças não merecem isso!". E alguém merece? Não seria o caso de se perguntar: O que merecem as nossas crianças? A educação brasileira continua sendo tratada como paliativo nesse projeto de crescimento estrondoso em que o Brasil se colocou nos últimos anos. A criança e o adolescente, cada dia mais, sem referências familiares e principalmente éticas, acabam encontrando respostas para suas indagações na rua, mas principalemente na internet, esse oceano de informações desmedidas que muitas vezes acaba desnorteando ainda mais a psiqué perdida dos jovens.

Por isso, a tragédia em Realengo não é sobre um assassino e suas 13 vítimas. É sobre uma cultura de barbárie, de violência e de exclusão cada vez mais corrente em nosso país. É sobre o fanatismo religioso que impregna nossa sociedade (querem crucificar agora os muçulmanos, ó país de cristãos fanáticos), é sobre exclusão social, é sobre a deseducação, é sobre o descaso da saúde pública, é sobre a falência da instituição familiar, é sobre ética, sobre moral, sobre política. É acima de tudo sobre a maquiagem, a máscara que a sociedade brasileira vem fantasiando nossas verdades em nome de um "bem comum", de uma paz de araque plantada no subconsciente das pessoas e que faz brotar apenas a alienação.


 O Brasil, país de visão clara, límpida e indefectível enxerga o Elefante em sua superfície. Diferente do filme cego de Gus Van Sant, que tateia, ouve e pensa antes de nos dizer quem é esse Elefante monstruoso.

sexta-feira, 1 de abril de 2011

Lamorisse no Cultura


Eis que o Cine Cultura - quase que numa resposta às minhas críticas no post sobre o circuito cinematográfico de Goiânia - exibe a partir dessa sexta-feira duas obras-primas indispensáveis do cineasta francês Albert Lamorisse, O Balão Vermelho e O Cavalo Branco, ambos em cópias restauradas.

O Balão Vermelho é um ícone do cinema francês, elegia à cidade de Paris e á infância, é considerado por muitos como um dos melhores filmes franceses de todos os tempos. Foi refilmado há 3 anos atrás pelo mestre taiwanês Hou Hsiao Hsien, com a musa Juliette Binoche, numa homenagem primorosa ao filme de Lamorisse e é claro também à Paris, personagem principal de ambos os filmes. O filme de Hou, A Viagem do Balão Vermelho, disponível em dvd, é outra experiência indispensável e que ganha destaque agora com a exibição do filme original, que acaba dando uma dimensão ainda maior do cinema do grande Albert Lamorisse. É sem sombra de dúvida o grande programa do fim de semana!

Ficha Técnica
Filme: O Balão Vermelho / O Cavalo Branco
Titulo original: Le Baloon Rouge / Crin Blanc
Diretor: Albert Lamorisse
Pais: França
Ano: 1956 / 1953
Duração: 38 min. / 40 min.
Elenco: Pascal Lamorisse / Alain Emery
Estreia: Sexta-feira, 1º de abril de 2011
Local: Cine Cultura
Sessões: Segunda a sexta-feira, às 18h30 e 20h30. Sábado, domingo e feriado às 17 e 19 horas
Ingressos: R$ 6 (Inteira) e R$ 3 (Meia- entrada)
Classificação indicativa: Livre
Contato: Cine Cultura – (62) 3201-4670 / 3201-4646

terça-feira, 15 de março de 2011

Um Lugar Qualquer (Somewhere)

Uma semana depois de ter visto “Somewhere” de Sofia Coppola, o filme ainda continua reverberando cada vez mais na cabeça. Apesar de ter me impressionado muito como peça de cinema, tinha achado o mais frágil filme da Sofia, principalmente por causa do final um tanto banal, que mais parecia final de comercial de carro importado.
Mas “Somewhere” é de fato o mais radical filme de Sofia Coppola que monotematicamente vem nos apresentando variações imagéticas sobre o mesmo tema. Ninguém filma o aprisionamento e o vazio como ela; e é interessante acompanhar essa evolução de cinema em sua filmografia. Se em "Virgen Suicidas" a decupagem parecia um pouco refém da trama, sem muito espaço para os delírios melancólicos que seriam potencializados em “Encontros e Desencontros” e “Maria Antonieta”, em “Somewhere” ocorre a radicalização desse processo fílmico, num filme que me parece antes de tudo uma versão de “Lost in Translation” filmada por Vincent Gallo e Gus Van Sant em sua fase mais experimental.
Nesse sentido, “Somewhere” consegue a proeza de ser o filme mais bonito de Sofia formalmente (o que não é pouco). Há ali pelo menos uma dúzia de sequências magníficas; desde a sequência incial ao som do Phoenix, quase que uma emulação da sequência inicial do igualmente melancólico "The Brown Bunny" de Vincent Gallo, até a extraordinária sequência da piscina do hotel, algo de antológico aquilo. Há outras, como as cenas das irmãs gêmeas em duas apresentações de pole dance, num misto de amadorismo e sensualidade impressionantes, filmadas num mesmo enquadramento estranho, sem qualquer corte; ou a da patinação do gelo quando Johnny Marco (Stephen Dorff) se encanta finalmente pela sua filha e aquele travelling impressionante quando ele vai moldar o rosto para fazer uma máscara que será usada em seu próximo filme.
Sofia prefere filmar esquetes ao invés de narrar sua história de maneira mais convencional. Dessa maneira ela consegue captar esse momentos de melancolia e vazio que exalam do seu personagem, num trabalho, aliás, belíssimo de Stephen Dorff. Ele consegue muito bem dar conta desse misto de angústia, futilidade e vazio que impregnam seu personagem: um ator famoso, solitário que vai aos poucos se encontrar no convívio com a filha adolescente que vai passar uma semana com ele no hotel em que mora. Fala-se muito no vazio existencial do personagem, mas eu vejo ali alguém constantemente perturbado e incomodado com essa incapacidade, apenas esperando alguém para resgatá-lo desse nada que é a sua vida.

Nada muito importante acontece. O que ocorre é uma sucessão de imagens absurdamente impregnantes que custam a sair da cabeça. Sofia Coppola se revela uma cineasta cada vez mais ciente de seu domínio cênico, e ajuda muito nisso tudo, a fotografia do sempre genial Harry Savides (coloborador habitual de Gus Van Sant) e a trilha sonora, sempre um prato cheio nos filmes de Coppola.
"Somewhere” me parece daqueles filmes que causam certo distanciamento a princípio, mas que carrega em suas imagens um poder tão devastador de traduzir toda a melancolia, as inquietações e frustrações de seu personagem, que é impossível passar incólume a elas. Não fosse o final um tanto óbvio e conciliador, “Somewhere” seria uma pequena obra-prima.